Desde 2023, o sociólogo e pedagogo Léo Radaik lidera um projeto inovador nas escolas de Garopaba e região: o Projeto Origami. O projeto é uma iniciativa de extensão do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC) e visa resgatar o valor das brincadeiras populares, utilizando o origami como ferramenta de ensino, criatividade e desenvolvimento integral das crianças. A técnica, que transforma folhas de papel em figuras tridimensionais, está sendo utilizada para reintroduzir conceitos esquecidos em uma era onde as telas eletrônicas dominam o tempo das crianças.
Léo, que trabalha com origami desde 2004, explica que o projeto surgiu de uma necessidade observada após a pandemia de covid-19. Ao retornar às escolas para ministrar oficinas, percebeu que muitas crianças não sabiam mais realizar simples atividades manuais, como dobrar um avião ou um barquinho de papel. “Foi surpreendente notar que as crianças ficaram espantadas quando fiz um avião de papel. Quando ele voou, foi como se tivessem visto algo inusitado. Isso me fez perceber que algo havia mudado na relação das crianças com as brincadeiras tradicionais,” relata o educador.
Esse contexto acendeu um alerta para Radaik sobre a importância de resgatar o que ele considera uma parte fundamental da infância: o brincar simples, sem a intermediação constante de tecnologias digitais. Segundo ele, o uso excessivo de telas — de celulares a videogames — está impactando a capacidade das crianças de interagir com o mundo de maneira criativa e física. Para o pedagogo, o origami vai além de ser apenas uma atividade lúdica; ele carrega uma série de benefícios no desenvolvimento motor, cognitivo e emocional das crianças.
O papel do origami no desenvolvimento infantil
Léo Radaik é enfático ao descrever o origami como uma ferramenta educacional completa. Ele aponta que a prática desenvolve coordenação motora fina, estimula a concentração, ativa a memória e fortalece a paciência. Além disso, segundo o educador, a atividade traz benefícios terapêuticos, promovendo sensação de bem-estar e relaxamento. “O origami proporciona uma conexão com o presente, algo que hoje em dia se torna cada vez mais raro devido à constante exposição às telas,” explica.
O projeto busca, portanto, equilibrar essa exposição aos dispositivos eletrônicos, trazendo de volta o prazer de criar algo tangível com as mãos. “As crianças, cada vez mais imersas em jogos digitais e desenhos animados, perdem o contato com atividades que estimulam a imaginação e a criatividade de forma prática,” afirma Léo, acrescentando que o brincar tradicional promove não apenas o desenvolvimento neurológico, mas também habilidades sociais essenciais.
A prática do origami também permite que os alunos desenvolvam conceitos geométricos e espaciais de forma concreta. Ao dobrar papéis e criar formas, as crianças entram em contato direto com noções matemáticas, sem que isso se transforme em uma experiência puramente teórica. Para Léo, o origami oferece uma maneira lúdica de aprender, conectando raciocínio e intuição.
Pedagogia Waldorf e o método da trimembração
Léo Radaik, formado em Pedagogia Waldorf, baseia suas oficinas no método da trimembração, um princípio da antroposofia que trabalha o desenvolvimento integral do ser humano por meio de três pilares: o pensar, o sentir e o querer. Segundo ele, as oficinas de origami são estruturadas de maneira a envolver essas três dimensões.
“O pensar está relacionado ao aspecto cognitivo, o sentir envolve a emoção e a imaginação, e o querer é a ação concreta, ou seja, o momento de realizar e materializar o que foi pensado e sentido. Essa integração faz com que a atividade não seja apenas uma prática técnica, mas uma experiência completa de aprendizado,” explica Léo.
Nas oficinas, a sequência de atividades é planejada de modo a engajar as crianças nesses três aspectos. Primeiro, são realizadas dinâmicas corporais que estimulam o raciocínio e a atenção. Em seguida, Léo introduz uma história ou um contexto que serve de pano de fundo para a criação do origami, conectando a técnica manual com o imaginário das crianças. Por fim, elas realizam a construção da figura de papel, tornando o aprendizado tangível.
“Não se trata de simplesmente ensinar a dobrar um papel. A questão é dar sentido ao que está sendo feito. Quando as crianças passam por esse processo completo, o aprendizado se torna muito mais significativo,” destaca Léo.
O impacto da pandemia e o resgate da cultura popular
O impacto da pandemia de covid-19 nas rotinas escolares foi um dos motivadores para o desenvolvimento do projeto. Radaik conta que a transição abrupta para o ensino remoto e o aumento do tempo de exposição às telas acelerou um processo de distanciamento das brincadeiras tradicionais. O projeto Origami surge, então, como uma resposta a esse cenário, buscando resgatar brincadeiras que, durante décadas, fizeram parte da cultura popular brasileira.
“A ideia central do projeto é que, com um simples pedaço de papel, podemos criar muito e nos divertir bastante. Esse princípio de simplicidade é algo que as gerações anteriores viviam, mas que está se perdendo,” afirma o educador. Léo também destaca a importância do brincar para o desenvolvimento infantil, mencionando que a falta de atividades físicas e criativas compromete o desenvolvimento cognitivo e motor das crianças, além de impactar negativamente sua saúde emocional.
Estudos apontam que o uso excessivo de mídias digitais pode levar a problemas como déficit de atenção, hiperatividade, falta de criatividade e até transtornos do sono e da alimentação. Com base nesses dados, Radaik defende que o projeto Origami não é apenas uma atividade recreativa, mas um ato de saúde pública. “Estamos lidando com uma geração que precisa urgentemente de um equilíbrio entre o digital e o físico. E o origami é uma das formas de proporcionar isso,” afirma.
Exposição fotográfica e o futuro do projeto
Além das oficinas em escolas, Léo Radaik planeja expandir o impacto do projeto através de uma exposição fotográfica, que está sendo desenvolvida em conjunto com a fotógrafa Elis Luna, criadora do projeto “Humans of Garopaba”. Elis, conhecida por transformar sua paixão pela fotografia em um projeto autêntico que captura a diversidade e autenticidade das pessoas da cidade, está colaborando com Léo para retratar o processo do origami nas escolas.
A ideia, segundo Léo, é provocar uma reflexão mais ampla sobre o futuro que queremos para nossas crianças e jovens. “O objetivo da exposição não é apenas mostrar o projeto, mas levantar a pergunta: Que futuro estamos construindo com tanta dependência de telas e com tão pouco espaço para a imaginação e o brincar?” diz Léo.
Atualmente, a exposição está em fase de captação de recursos, mas ambos estão otimistas de que o projeto será concretizado em breve. “É uma forma de conscientizar a comunidade e as famílias sobre a importância de equilibrar o uso da tecnologia com atividades manuais e criativas,” conclui Léo.
Enquanto isso, o projeto Origami segue transformando a vida das crianças de Garopaba, oferecendo uma alternativa saudável e educativa para o desenvolvimento infantil em tempos digitais.