A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Câmara Municipal de Garopaba, instaurada para investigar supostas irregularidades em contratos de obras públicas executadas pela empresa Israel Gonçalves Eireli, realizou uma sessão na tarde desta sexta-feira 30 de agosto, trazendo à tona graves denúncias de superfaturamento, manipulação de aditivos contratuais e influência direta do poder executivo municipal nos processos de contratação.
A reunião, que começou às 14h19min, contou com a presença dos vereadores Felippe de Souza (MDB) presidente, Rogério Linhares (Podemos) vice-presidente, João Julião Luz Lopes (MDB) relator e Jairo Pereira dos Santos (PP) membro. Sérgio Luiz Gonçalves (PL), também membro da comissão, esteve ausente.
Objetivo da CPI
A CPI foi criada com o propósito de apurar denúncias de que a empresa Israel Gonçalves Eireli, contratada pela Prefeitura de Garopaba, teria sido beneficiada por aditivos contratuais e outros mecanismos para encobrir falhas e possivelmente desviar recursos públicos. As obras sob suspeita incluem a construção do subsolo do Garopaba Pronto Atendimento (GPA), o Centro Educacional Infantil Francisco Domingos Pacheco, e a instalação de um portão no pátio lateral da Prefeitura.
Depoimento de Israel Gonçalves: Revelações e Contradições
Israel Gonçalves, dono da empresa investigada, foi convocado para prestar depoimento e respondeu a diversas perguntas dos membros da CPI. Ele foi inicialmente questionado sobre um aditivo de R$ 102.000,00 adicionado ao contrato da obra do GPA Subsolo.
Documentos analisados pela comissão indicaram que pareceres técnicos e jurídicos foram emitidos antes mesmo de o pedido formal do aditivo ser apresentado, levantando suspeitas de manipulação documental. Gonçalves admitiu que não entendia as minúcias burocráticas, alegando que sua função era exclusivamente a execução das obras, e que já havia relatado as inconsistências à polícia.
Um dos pontos mais críticos do depoimento foi a revelação de que o prefeito Junior de Abreu Bento (PP) teria exercido forte influência sobre as decisões relativas às obras, incluindo a contratação de outras empresas para executar partes dos serviços que deveriam ser realizados pela empresa de Israel. Segundo o depoente, a empresa Maribox foi indicada diretamente pelo prefeito para realizar trabalhos de esquadrias, e ele foi obrigado a pagar R$ 240.000,00 a essa empresa, muito acima dos R$ 142.000,00 originalmente previstos na planilha de custos.
Apesar dessas alegações, a Maribox, em nota divulgada no dia 20 de agosto, já havia negado qualquer envolvimento com o Poder Público. No entanto, fotos publicadas nas redes sociais da empresa mostram o fornecimento de produtos em obras municipais de Garopaba, o que levanta questionamentos sobre a veracidade das declarações e o real papel da empresa nas obras investigadas pela CPI.
O que diz o Prefeito Junior
Em 26 de agosto, dias antes da sessão da CPI, o prefeito Junior publicou um vídeo em suas redes sociais comentando sobre a operação Maestro e as alegações feitas por Israel Gonçalves, que o acusou de direcionar obras e cobrar pagamentos de fornecedores. No vídeo, o prefeito explicou que, como gestor, sua responsabilidade era garantir que os pagamentos fossem feitos para assegurar a continuidade e a qualidade dos serviços públicos. Junior também afirmou que Israel estaria com salários de seus funcionários atrasados, o que teria motivado suas cobranças.
Durante a CPI, Israel Gonçalves negou a acusação de atrasos salariais, afirmando que sempre manteve os pagamentos de seus funcionários em dia e que as cobranças feitas pelo prefeito eram, na verdade, para pressioná-lo a realizar pagamentos a outras empresas envolvidas nas obras.
Superfaturamento e Aditivos Irregulares
A CPI também abordou a questão do superfaturamento no aditivo de R$ 102.000,00. Israel Gonçalves confirmou que o aditivo foi usado para cobrir pagamentos a outras empresas, conforme determinação do prefeito Junior, alegando que, sem esse recurso extra, a obra não poderia ser concluída, especialmente no que diz respeito à parte elétrica. Ele afirmou que os custos relacionados à parte elétrica superaram em mais de R$ 50.000,00 o valor originalmente orçado, e que foi necessário um aditivo para cobrir essa discrepância.
A comissão suspeita que o aditivo tenha sido fabricado para justificar o desvio de recursos, e que parte do montante foi utilizada para pagar dívidas de outras empresas contratadas informalmente pelo prefeito, sem que essas despesas estivessem previstas nos contratos originais.
Manutenção Predial e Outras Obras Sob Suspeita
Outro foco da investigação foi a manutenção predial de escolas municipais durante a pandemia de covid-19. Israel Gonçalves foi fortemente questionado pelo vereador Jairo Pereira dos Santos sobre como conseguiu, em apenas três dias, realizar reformas em 15 escolas municipais, incluindo a instalação de divisórias e outras melhorias.
O curto prazo para a execução dos serviços, aliado ao fato de que as escolas estavam fechadas devido à pandemia, levantou suspeitas sobre a veracidade dos serviços prestados. Gonçalves, no entanto, defendeu-se afirmando que os serviços foram realizados ao longo do tempo e que ele nunca cobrou por algo que não tivesse executado, embora admitisse não entender os detalhes burocráticos dos empenhos e pagamentos.
Manipulação de Licitações e Contratos
A CPI também abordou a questão da manipulação de licitações e a possível subcontratação ilegal de empresas. Israel Gonçalves revelou que, em um contrato para obras no Complexo da Encantada, ele foi orientado pelo prefeito Junior a passar a execução do projeto para uma empresa terceirizada, embora sua empresa tivesse vencido a licitação. Ele afirmou que, apesar de sua empresa ter sido a vencedora formal da licitação, o prefeito decidiu que a obra seria realizada por outra empresa, a RS Engenharia, com quem Israel deveria subcontratar, em uma manobra que contraria as normas de licitação pública.
Pressões Políticas e Ingerências Administrativas
Ao longo do depoimento, Israel Gonçalves revelou a existência de pressões políticas significativas, afirmando que o prefeito Junior tinha o controle total sobre as decisões relacionadas às obras e que ele, Israel, apenas seguia ordens para garantir que os pagamentos fossem feitos às empresas indicadas.
Ele mencionou, por exemplo, que foi obrigado a pagar R$ 7.000,00 para a instalação de um portão, trabalho que deveria ter sido realizado por outra empresa, mas que, devido à falta de regularidade nos contratos, foi passado para ele sem que sua empresa tivesse sido formalmente contratada para esse serviço.
Próximos Passos
A CPI de Garopaba continua a aprofundar suas investigações, com a próxima reunião marcada para o dia 3 de setembro. A comissão planeja convocar outros envolvidos, incluindo representantes das empresas citadas por Israel Gonçalves, para esclarecimentos adicionais. O uso do inquérito da operação Maestro, que investiga outros desvios de recursos públicos, também está sendo considerado para dar suporte às investigações da CPI.