Na sessão ordinária da Câmara de Garopaba, realizada nesta terça-feira (1º), professores da rede municipal de ensino, protagonizaram um protesto contra a desvalorização da categoria e as condições nas escolas públicas do município. Em discurso feito pela professora Mariana Souza, o grupo denunciou a falta de investimentos na educação, sobrecarga de trabalho dos docentes e criticou o programa “Recicle Bem, Faça o Bem”, apontado como um desvio de recursos que poderiam ser destinados a necessidades mais urgentes nas escolas.
A sessão teve momentos de grande tensão e debate intenso, especialmente após a fala do vereador Sérgio Jacaré (PL), que foi vaiado ao defender a gestão da atual Secretaria de Educação, gerando forte reação por parte do público presente, formado majoritariamente por professores e pais de alunos.
Em um discurso na tribuna, a professora Mariana Souza expôs a realidade enfrentada pelos profissionais da educação e os alunos da rede municipal. Segundo ela, a educação em Garopaba está em uma crise profunda, com falta de infraestrutura, materiais pedagógicos insuficientes e professores sobrecarregados. “Estamos aqui de preto, em luto pela educação. A educação de Garopaba está sendo sucateada, e nós, professores, estamos esgotados”, iniciou Mariana.
Uma das críticas da professora foi direcionada ao programa Recicle Bem, Faça o Bem, que, segundo ela, representa um uso ineficaz de recursos públicos. “Projetos milionários como o Recicle Bem surgem sem critérios claros, escoando milhões de reais da educação para um buraco. Com o valor investido apenas este ano, poderíamos ter construído uma nova creche para atender comunidades como Areias de Palhocinha, que precisam urgentemente de mais vagas e de uma infraestrutura adequada”, afirmou. O programa Recicle Bem, Faça o Bem já foi alvo de investigação pelo Tribunal de Contas de Santa Catarina, resultando em multas para servidores incluindo o prefeito Junior de Abreu Bento (PP).
Ela também destacou que, em algumas escolas, os problemas estruturais são graves. “Eu trabalho em um CEI inaugurado em 2023, mas até hoje não temos o mobiliário e os materiais adequados para todas as faixas etárias. Os professores têm que tirar do próprio bolso para comprar materiais que deveriam ser fornecidos pela prefeitura. Isso não é aceitável”, desabafou a professora.
Mariana também chamou atenção para o impacto da má gestão na saúde dos professores. “Estamos adoecendo. Turmas superlotadas, falta de apoio, e ainda somos obrigados a assumir funções que não são nossas. Isso está nos sobrecarregando. Estamos sofrendo com o adoecimento físico e mental”, revelou, pedindo urgência nas medidas para aliviar a pressão sobre os profissionais.
Um dos pontos preocupantes destacados por Mariana foi a queda no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) do município. Garopaba, que em 2019 alcançou a nota 7,5, viu esse número cair para 6,9 em 2024. Para a professora, esse retrocesso é resultado de uma gestão que tem negligenciado a educação. “Se os professores são os mesmos que alcançaram excelentes resultados no passado, o que mudou de 2017 para cá foi a gestão. A educação deixou de ser prioridade, e isso está refletido nos números. Estamos perdendo qualidade”, afirmou.
A professora concluiu seu discurso pedindo mais diálogo entre a gestão pública e os profissionais da educação, além de mais investimento direto nas escolas e nos alunos. “Nós, professores, somos a base do desenvolvimento de qualquer sociedade. Se quisermos uma educação justa e próspera, precisamos começar pela valorização de quem está todos os dias na sala de aula. Não aceitamos mais que recursos sejam desperdiçados enquanto nossos alunos carecem de infraestrutura básica”, declarou.
Reações dos vereadores
Após o pronunciamento de Mariana, diversos vereadores se manifestaram, dividindo opiniões e acirrando o debate.
O vereador João Julião Luz Lopes (MDB) demonstrou apoio à fala dos professores e reconheceu que o legislativo falhou em algumas questões relacionadas à educação. “Eu acho que lá atrás, em determinado momento, eu errei com vocês, talvez por não ter me esforçado o suficiente para ver de perto a realidade nas escolas”, admitiu. Ele endossou as críticas ao programa Recicle Bem, Faça o Bem denunciado por ele ao Tribunal de Contas. “Foi um gasto desnecessário. Dinheiro que deveria ter sido investido em prioridades claras da educação”, afirmou.
O vereador Felippe de Souza (MDB) também se colocou ao lado dos professores e criticou a falta de diálogo entre a gestão municipal e a categoria. “A classe dos professores nunca foi ouvida de verdade. Aprovaram o plano de carreira sem consultar quem está na linha de frente da educação”, afirmou Felipe. Ele reforçou a necessidade de melhor gestão dos recursos públicos e lamentou a priorização de programas que não atendem diretamente às necessidades das escolas. “Os recursos precisam ser geridos com responsabilidade, e isso não está acontecendo”, completou.
Um momento tenso da sessão ocorreu durante a fala do vereador Sérgio Luiz Gonçalves Jacaré (PL), que defendeu a gestão da Secretaria de Educação, liderada por Fernanda, minimizando as críticas feitas pelos professores. “Eu parabenizo a secretária Fernanda pelo belo trabalho que ela vem fazendo. A educação em Garopaba é de qualidade, só não vê quem não quer”, afirmou Jacaré. Essa declaração provocou uma reação imediata do público presente, que o vaiou intensamente, em especial os professores e pais de alunos, que se sentiram desrespeitados pela tentativa de desqualificar suas denúncias.
Sérgio Jacaré também ironizou a fala da professora Mariana, mencionando que ela ingressou recentemente na rede municipal. “Ainda bem que você entrou agora, porque gostaria de ver o seu pronunciamento antes”, disse ele. Além disso, o vereador Sérgio Jacaré trouxe à tona relatos de sua irmã, Sônia Gonçalves, que é professora, diretora e presidente do MDB Mulher de Garopaba. Ele afirmou que durante gestões anteriores sua irmã enfrentava os mesmos problemas relatados agora, como a falta de materiais nas escolas. “Minha irmã Sônia me dizia o tempo todo que faltava até papel higiênico nas escolas. Isso não é novidade, e não vi protestos como este naquela época”, criticou Jacaré, o que gerou novas vaias da plateia.
O presidente da Câmara, vereador Jean Ricardo Antunes (PSB) fez um discurso enfático em defesa dos professores, destacando a necessidade urgente de valorização da categoria. Ele afirmou que os docentes são fundamentais para o desenvolvimento da cidade e que o respeito a esses profissionais deve ser uma prioridade. Jean mencionou, ainda, que sua esposa, mãe de sua filha, foi vítima de ataques à sua honra durante sua atuação na educação, denunciando um episódio de assédio que ela sofreu na Secretaria de Educação. Ele alertou que perseguições contra professores ou qualquer tipo de represália não seriam toleradas e garantiu que, caso qualquer profissional da educação enfrente intimidações, poderia contar com o apoio integral da Câmara Municipal. “Se houver perseguição, vocês podem contar com esta casa legislativa. Nós estaremos ao lado de vocês”, reforçou o vereador, comprometendo-se a lutar pela proteção e valorização dos professores.
O movimento dos professores, que vem se organizando desde 2021, cobra não apenas melhorias salariais, mas também investimentos em infraestrutura, formação continuada e, principalmente, uma maior abertura ao diálogo com a gestão municipal. A professora Mariana Souza encerrou sua fala reforçando o apelo por uma educação pública de qualidade para os alunos de Garopaba. “A precarização da educação é um projeto político. Mas nós, professores, não vamos aceitar que as condições das escolas e dos nossos alunos continuem piorando. Vamos lutar por uma educação que respeite nossas crianças e valorize os profissionais que estão todos os dias na sala de aula”, finalizou.
Assista a transmissão da Sessão Ordinária da Câmara de Garopaba pelo YouTube.