sexta-feira, 25 julho 2025

MPF cobra reparação de danos ambientais da Surfland em ação sobre empreendimento na APA da Baleia Franca

Além da empresa, União, Ibama, ICMBio, IMA, Iphan e Prefeitura de Garopaba também são réus na ação do MPF, que os acusa por omissão e falhas na fiscalização em área ambiental federal.
Foto: GEO APA da Baleia Franca
Foto: GEO APA da Baleia Franca

O complexo turístico Surfland Brasil Garopaba, localizado no bairro Capão, no município de Garopaba (SC), é alvo de uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) que tramita desde agosto de 2023 na Justiça Federal. O empreendimento turístico está sob investigação por supostos danos ambientais em Área de Preservação Permanente (APP) e sobre bens da União. O MPF aponta irregularidades na concessão de licenças, ausência de estudos de impacto e omissão de órgãos públicos na fiscalização da obra.

A ação foi proposta na 1ª Vara Federal de Tubarão pelo Procurador da República Eduardo Herdt Barragan e está registrada sob o número 5001660-69.2023.4.04.7216. Além da empresa Surfland Brasil Garopaba Incorporações SPE Ltda., são réus no processo a União, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), o Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA), o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e a Prefeitura de Garopaba.

Empreendimento de grande porte

De acordo com os documentos que instruem o processo, o empreendimento inclui hotel com 295 unidades habitacionais, 318 vagas de estacionamento, parque aquático, academia, restaurante, áreas de lazer e demais estruturas. Segundo o Ministério Público Federal, o projeto ocupa área no entorno e dentro dos limites da Área de Proteção Ambiental (APA) da Baleia Franca, unidade de conservação federal, e sobre terrenos pertencentes à União.

A construção, segundo o MPF, desrespeita normas ambientais federais, estaduais e municipais, tendo sido realizada sem a devida análise prévia de impactos ambientais e sociais. O órgão aponta que entre 2019 e 2023 foram executadas diversas obras com licenças que considera “precárias” ou insuficientes para a escala e o tipo de impacto do empreendimento.

Foto: Divulgação/Surfland

Leia também: Surfland Brasil enfrenta mais de 300 ações de investidores após atrasar obra em Garopaba

O que pede o Ministério Público Federal

Na ação civil pública, o Ministério Público Federal solicita que a Justiça determine a demolição integral de todas as estruturas construídas sobre áreas de preservação permanente e terrenos da União. Isso inclui ruas internas, muros de contenção, unidades habitacionais, piscina, estacionamentos e demais instalações erguidas em solo onde a legislação federal proíbe qualquer tipo de edificação. O MPF requer também que a empresa remova as fundações e os resíduos sólidos resultantes das obras, com destinação ambientalmente adequada, e que apresente um Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD) a ser executado sob supervisão técnica do Ibama.

Além da restauração física da área, o MPF pede que a Justiça proíba a empresa de realizar quaisquer novas intervenções ou ampliações nas áreas irregulares, mesmo que em cenário futuro de eventual regularização. O órgão requer também a anulação de todas as licenças ambientais e autorizações urbanísticas emitidas por União, IMA, ICMBio, Iphan, Ibama e Prefeitura de Garopaba, por considerar que foram concedidas sem embasamento técnico suficiente ou sem observar a complexidade e o potencial impacto do empreendimento.

Outro ponto relevante da ação é o pedido de responsabilização financeira da empresa pelos danos materiais e ambientais causados ao ecossistema da região e ao patrimônio arqueológico identificado na área. O MPF solicita que a empresa seja condenada a pagar indenização pelos prejuízos coletivos, além de requerer a aplicação de multa diária de R$ 5 mil em caso de descumprimento de qualquer das obrigações determinadas judicialmente. Essa multa deve incidir tanto sobre a empresa quanto sobre os agentes públicos responsáveis pelos órgãos réus, em caso de omissão no cumprimento das medidas.

Caso a Justiça venha a admitir algum tipo de regularização do empreendimento, o MPF sustenta que isso só poderá ocorrer mediante a realização de Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), abrangendo todas as estruturas do complexo — como hotel, parque aquático e unidades residenciais —, bem como a apresentação de Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), com ampla divulgação e participação social por meio de audiências públicas. Além disso, solicita que todo o processo de licenciamento seja reiniciado com base nos parâmetros técnicos atuais e sob acompanhamento dos órgãos ambientais federais.

Os pedidos do MPF são embasados em laudos técnicos produzidos pela Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise da Procuradoria-Geral da República. Os peritos identificaram a supressão de vegetação, movimentação de solo, pavimentações e edificações dentro de áreas protegidas, além da ausência de licenciamento ambiental adequado.

De acordo com o órgão, em parecer específico, técnicos apontaram que parte do empreendimento foi construída em Área de Preservação Permanente (APP), zona que exige autorização federal por estar inserida na APA da Baleia Franca. Outro laudo técnico avalia a presença de sítios arqueológicos na região, indicando que a empresa firmou Termo de Ajustamento de Conduta com o Iphan, ainda assim sem a devida profundidade nos estudos exigidos.

Audiência e tentativa de acordo

Uma audiência de conciliação foi realizada em 23 de outubro de 2023 pela 1ª Vara Federal de Laguna. Sob coordenação do juiz Timoteo Rafael Piangers, participaram da audiência representantes do MPF, da empresa e dos entes públicos réus. Na reunião, o magistrado determinou que a empresa apresentasse, no prazo de 15 dias, uma proposta formal de acordo tratando das questões ambientais e legais apontadas na ação.

A proposta foi protocolada pela empresa e passou por análise do MPF, que acionou sua assessoria pericial. Após isso, os demais réus tiveram 15 dias para apresentar manifestações. A empresa chegou a indicar disposição para realizar o EIA, mas alegou que as obras já estavam em estágio final e não poderiam ser paralisadas ou ter sua inauguração adiada.

Em manifestação posterior, o IMA chegou a considerar viável a regularização do empreendimento sem a exigência de um novo EIA. No entanto, o MPF sustentou que qualquer continuidade do projeto dependeria de novo processo de licenciamento completo, considerando o porte e a complexidade do empreendimento.

Proposta apresentada pela empresa

Durante audiência de conciliação realizada ainda em outubro de 2023, a empresa Surfland Brasil Garopaba Incorporações SPE Ltda apresentou à Justiça Federal uma proposta de acordo relacionada às questões ambientais e urbanísticas em discussão na ação civil pública. A proposta foi encaminhada às partes após determinação da 1ª Vara Federal de Laguna, com prazo de 15 dias para manifestação, e passou por análise técnica do MPF e dos demais órgãos envolvidos.

No documento apresentado, a empresa se comprometeu a elaborar um Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), mas solicitou que essa exigência não implicasse na paralisação das obras nem na suspensão da operação do empreendimento, que já se encontrava em fase adiantada. A Surfland também manifestou interesse em continuar as tratativas para eventual celebração de um acordo judicial com os entes públicos.

Como contrapartida urbanística, a empresa propôs a construção de uma arena esportiva multiuso em substituição à doação de 5% da área do parque temático ao Município de Garopaba, conforme previsto em diretrizes anteriores. Informou ainda que a Rua Rodolfo Sampaio, via de acesso principal ao empreendimento, estaria em fase de pavimentação executada pelo poder público municipal e que poderia apresentar um cronograma de execução. Também indicou alternativa de acesso a uma área encravada da propriedade que evitaria a supressão de vegetação nativa.

Sobre o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV), a empresa sustentou que não estaria obrigada a realizá-lo, argumentando que o Plano Diretor de Garopaba não prevê regulamentação específica sobre o instrumento. Em relação à proteção do patrimônio arqueológico, a Surfland informou que firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), o qual estava vencido, mas em tratativas para prorrogação e renovação dos compromissos.

Nenhuma decisão judicial foi tomada

Até o momento, a Justiça Federal não proferiu nenhuma decisão de mérito nem concedeu liminar em favor do MPF. Os pedidos formulados na ação aguardam análise judicial, assim como a proposta de acordo apresentada pela empresa.

Apesar da apresentação da proposta, o MPF manifestou ressalvas quanto à sua suficiência técnica e legal. O órgão apontou que diversas pendências permanecem sem resposta clara, especialmente no que diz respeito à legalidade das vias de acesso ao empreendimento, à supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente (APP) e à ausência de estudos aprofundados sobre os impactos ambientais e urbanísticos da ocupação. Para o MPF, essas fragilidades impedem qualquer avanço rumo a um acordo sem a devida regularização e responsabilização.

A ação permanece em fase de instrução, sem que os pedidos de demolição, paralisação das obras, elaboração de PRAD, aplicação de multas ou responsabilização dos entes públicos tenham sido analisados formalmente pela Justiça.

Processo está sem juiz após declaração de suspeição

O andamento do processo foi interrompido em 5 de maio de 2025, após o juiz federal Germano Alberton Júnior declarar-se suspeito para atuar no caso. Segundo o despacho, ele alegou relação de amizade com o proprietário da empresa ré Surfland, André Luis Giesta da Silva, e com sua esposa, Sandra Goulart da Silva, promotora de Justiça da Comarca de Imbituba.

O processo havia sido redistribuído à 1ª Vara Federal de Criciúma pela Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4ª Região. Até então, a condução dos autos estava a cargo da juíza federal substituta Ana Lidia Silva Mello, que atuava no caso desde 2024. Com o afastamento da juíza por convocação a um tribunal superior, os autos foram repassados provisoriamente ao juiz Germano Alberton. Diante da causa de impedimento, ele determinou o retorno do processo à Corregedoria Regional, para nova designação judicial, conforme a Consolidação Normativa da 4ª Região.

Desde então, o processo está sem juiz titular definido. Permanecem sem análise os pedidos do Ministério Público Federal, que incluem a demolição de estruturas em área protegida, recuperação ambiental, anulação de licenças e responsabilização de réus públicos e privados.

Leia também

Compartilhe a notícia

Últimas notícias em Garopaba.sc

Evento acontece neste sábado (26) e marca a regularização das primeiras embarcações de Santa Catarina.
Além da empresa, União, Ibama, ICMBio, IMA, Iphan e Prefeitura de Garopaba também são réus na ação do MPF, que os acusa por omissão e falhas na fiscalização em área ambiental federal.
Mostra acontece entre os dias 16 e 29 de setembro de 2025, na Casa de Cultura, com foco em inclusão e diversidade artística.

Receba tudo em
seu e-mail

Assinatura Boas Vindas R$0,00/mês